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Afinal, qual a melhor estratégia a se seguir em relação ao manejo do paciente que se apresenta com isquemia moderada/importante em exames de estratificação não-funcional.
Essa é uma pergunta que atormenta todo cardiologista clínico antes de deitar na cama e dormir.
As duas estratégias em foco na literatura são (na ausência de sintomas limitantes, evento coronariano agudo ou quadro de disfunção ventricular grave com sintomas de IC ) as seguintes:
1) Iniciar tratamento medicamentoso otimizado (TMO), incluindo drogas modificadoras de doença AAS, estatinas, iECA / BRA e anti-anginosas, e seguir o paciente clinicamente
2) Já partir para uma proposta de revascularização do miocárdio, seja por tratamento percutâneo(ICP) ou revascularização do miocárdio (RVM), associado ao TMO.
Atualmente, há uma vasta gama de produções científicas que parecem respaldar as duas condutas de maneira que a situação chegou a um 'equipoise', ou seja, uma amparente equivalência entre as duas condutas. Sendo assim, deveriamos levar em conta uma série de fatores para definir, de maneira não cartesiana, qual caminho a se seguir. Esse é um dilema parecido com a questão da fibrilação: controle do ritmo ou da frequência cardíaca, que abordamos previamente aqui.
O artigo é dividido em duas partes de maneira que em cada uma delas os autores se propõem a atuar como 'advogados' que cada estratégia e recomendam de maneira firme que, sobretudo naqueles que 'já tem aquele velha opinião formada sobre tudo', leiam com atenção os motivos defendidos pela vertente de pensamento oposta.
A impressão final é de que somente a individualização de tratamento é que guiaria o melhor caminho a se traçar.
De maneira resumida, o artigo tenta ponderar algumas situações que favoreceriam uma ou outra estratégia e que tomamos a liberdade de traduzir, adaptar e expor abaixo:
FAVORECE REVASCULARIZAÇÃO DE ROTINA INICIAL
1) Há uma correlação de isquemia e subsequente morte ou infarto.
2) Revascularizar o doente acaba por diminuir a isquemia de maneira mais contundente que o tratamento clínico otimizado
3) Vários estudos observacionais de larga escala e alguns randomizados demonstraram uma diminuição da taxa de infarto e morte nos grupos que eram revascularizados em comparação aos de TMO.
4) Tanto a ICP quanto a RVM são métodos em contínua evolução, de maneira que o arsenal tecnológico atual tem maior poder em redução de isquemia e diminuição de morte e IAM em relação as técnicas estudadas previamente.
5) Praticamente todos os estudos comparando RV x TMO mostraram que a revascularização reduz de maneira mais eficiente os quadros de angina e melhoram a qualidade de vida durante os anos. As curvas de tendência em relação aos sintomas acabam se igualando no grupos graças em grande parte ao grande 'cross-over' que se tem entre as estratégias, ou seja, ao passar dos anos, muitos do 'braço TMO' acabam sendo submetidos a revascularização por piora de sintomas.
6) A adesão medicamentosa pode ser difícil e muitos pacientes irão optar por se submeter a uma revasculatização com objetivo de alívio de sintomas mais rápido e reduzir o número de medicações com objetivo apenas de alívio sintomático. Portanto, leve em consideração a opinião do doente.
7) Realizar a RV não significa abandonar o TMO, mas sim facilitar a adesão medicamentosa do doente através da diminuição de algumas medicações. Além disso, para alguns, ser submetido a um procedimento médico pode servir como um 'divisor de águas' que irá contribuir, também, para um reforço nas mudanças de estilo de vida a serem tomadas.
FAVORECE O TRATAMENTO MEDICAMENTOSO OTIMIZADO INICIAL
1) O TMO faz parte do tratamento de TODO o paciente com doença coronária crônica, independente de ser ou não feita a revascularização, pois as medicações/mudanças no estilo de vida são redutores de mortalidade e infarto. Temos de entender que a revascularização é uma opção a mais para o tratamento anginoso em casos refratários, mas não a substitui. Portanto, mesmo quem é submetido uma ICP ou RVM, deve manter seu tratamento clínico.
2) Os estudos mais recentes, já a luz do tratamento atual envolvendo AAS, estatinas, iECA/BRA e beta-bloqueadores, falham em conseguir mostrar link claro entre o tratamento invasivo e uma redução em desfechos 'fortes', ou seja, morte e IAM.
3) A ICP, método de revascularização mais frequente, falha em conseguir mostrar benefício em relação a aumentar sobrevida nos trabalhos feitos no contexto de doença coronariana estável.
4) Novas modalidades de tratamento, como dupla anti-agregação em um contexto mais tardio após síndrome coronarianas agudas e novas drogas, como os inibidores de PCSK 9 ( um novo hipolipemiantes) vem surgindo e vem a somar esforços na diminuição de morte e IAM.
5) O benefício em relação a qualidade de vida em pacientes submetidos a revascularização parece limitado, sobretudo em relação a ICP quando comparada a RVM. As análises dos estudos são prejudicadas pelo fato de os grupos não serem 'cegos' e outros fatores confundidores estarem presentes. Por exemplo, o paciente que tende a diminuir a intensidade dos sintomas pelo simples fato de ter sido submetido a um 'tratamento mais moderno' ao invés de ter ficado tomando 'só remédio'.
6) Um 'trial' medicamentoso antes de se pensar em revascularização não põem o doente em risco de consequências graves e pode, muitas vezes, já ser responsável por alívio dos sintomas e melhora de qualidade de vida sem a necessidade de procedimento adicional ( lembrando que tanto a ICP quanto a RVM tem risco inerentes para o doente, inclusive de morte ou sequela grave!).
7) Indicar de rotina revascularização tem um impacto financeiro maior para paciente e para sociedade. Portanto, leve em conta o meio onde você prática a medicina (UBS, Hospital Secundário, Centro de Cardiologia,etc), os recursos que estão disponíveis e a condição sócio-econômica do doente.
8) A preferência do doente pode ser primeiro a de se fazer um teste com medicação!
#PS: Sugerimos fortemente a leitura de um texto publicado no Arquivos de Cardiologia em 2014, de autoria do Prof Luís Cláudio Correia, que aborda de maneira brilhante sobre o tema em evidência e também nos faz refletir. O título é: Revascularização Miocárdica Guiada por Isquemia: o Reflexo
Oculoisquêmico.
Leitura Sugerida:
Stone et al. Medical Therapy With Versus Without Revascularization in Stable Patients With Moderate and Severe Ischemia The Case for Community Equipoise. STATE-OF-THE-ART REVIEW. Nov/2015. Online first. Disponível aqui
Correia, LCL e cols. Ponto de vista: Revascularização Miocárdica Guiada por Isquemia: o Reflexo Oculoisquêmico. Arq Bras Cardiol. 2014; 102(4):e40-e43. Disponível aqui
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