sábado, 28 de novembro de 2015

Imagens em Cardiologia - o que está acontecendo com esse marcapasso ?




Fonte: arquivo pessoal do autor

O paciente portador de marcapasso transvenoso provisório (MTVP)  tem de ser mantido sob constante vigilância até que se tenha uma conduta definitiva a ser feita.

Para isso, o doente deve permanecer com monitorização eletrocardiográfica contínua e ter as configuração de comando do MTVP aferidas, pelo menos, 2 x ao dia.

Na monitorização, deveremos ver um traço vertical precedente o QRS do paciente. Esse 'traço' representa a espícula do marcapasso e pode ser 'maior', quando for unipolar, ou 'menor' quando for bipolar.

Esses marcapassos operam em modo VVI ( para mais noções de nomenclatura veja aqui ), ou seja, estimulam o ventrículo (V), sente o batimento do ventrículo (V) e, quando o sentem, inibem-se para o estímulo próprio ventricular assuma o comando.

No traçado acima, conseguimos ver algumas espículas do marcapasso que não estão sendo conduzidas, ou seja, seguidas de um QRS logo a seguir. Esse tipo de situação é chamado de falha de captura, que pode ser secundário a diversos fatores, tais como: deslocamento do cabo-eletrodo(CE), fratura do CE, perfuração do miocárdio ou mesmo distúrbios hidroeletrolíticos acometendo o paciente.

quarta-feira, 25 de novembro de 2015

Tratamento Clínico Otimizado x Revascularização inicial em pacientes isquemia moderada/severa: há uma resposta certa para todos os doentes ?

Fonte: http://www.shutterstock.com/pt/pic.mhtml?irgwc=1&utm_campaign=Pixabay&utm_source=44814&&tpl=44814-43068&id=161737835&utm_medium=Affiliate
No final desse mês de novembro, o Journal of  the American College of Cardiology (JACC) lançou um artigo de revisão de um tema para lá de polêmico no contexto da doença coronariana crônica.

Afinal, qual a melhor estratégia a se seguir em relação ao manejo do paciente que se apresenta com isquemia moderada/importante em exames de estratificação não-funcional.

Essa é uma pergunta que atormenta todo cardiologista clínico antes de deitar na cama e dormir.

As duas estratégias em foco na literatura são (na ausência de sintomas limitantes, evento coronariano agudo ou quadro de disfunção ventricular grave com sintomas de IC ) as seguintes:

1) Iniciar tratamento medicamentoso otimizado (TMO), incluindo drogas modificadoras de doença AAS, estatinas, iECA / BRA e anti-anginosas, e seguir o paciente clinicamente

2) Já partir para uma proposta de revascularização do miocárdio, seja por tratamento percutâneo(ICP) ou revascularização do miocárdio (RVM), associado ao TMO.

Atualmente, há uma vasta gama de produções científicas que parecem respaldar as duas condutas de maneira que a situação chegou a um 'equipoise', ou seja, uma  amparente equivalência entre as duas condutas. Sendo assim, deveriamos levar em conta uma série de fatores para definir, de maneira não cartesiana, qual caminho a se seguir. Esse é um dilema parecido com a questão da fibrilação: controle do ritmo ou da frequência cardíaca, que abordamos previamente aqui.

O artigo é dividido em duas partes de maneira que em cada uma delas os autores se propõem a atuar como 'advogados' que cada estratégia e recomendam de maneira firme que, sobretudo naqueles que 'já tem aquele velha opinião formada sobre tudo', leiam com atenção os motivos defendidos pela vertente de pensamento oposta.

A impressão final é de que somente a individualização de tratamento é que guiaria o melhor caminho a se traçar. 

De maneira resumida, o artigo tenta ponderar algumas situações que favoreceriam uma ou outra estratégia e que tomamos a liberdade de traduzir, adaptar e expor abaixo:

FAVORECE  REVASCULARIZAÇÃO DE ROTINA INICIAL

1) Há uma correlação de isquemia e subsequente morte ou infarto.
2) Revascularizar o doente acaba por diminuir a isquemia de maneira mais contundente que o tratamento clínico otimizado
3) Vários estudos observacionais de larga escala e alguns randomizados demonstraram uma diminuição da taxa de infarto e morte nos grupos que eram revascularizados em comparação aos de TMO.
4) Tanto a ICP quanto a RVM são métodos em contínua evolução, de maneira que o arsenal tecnológico atual tem maior poder em redução de isquemia e diminuição de morte e IAM em relação as técnicas estudadas previamente.
5) Praticamente todos os estudos comparando RV x TMO mostraram que a revascularização reduz de maneira mais eficiente os quadros de angina e melhoram a qualidade de vida durante os anos. As curvas de tendência em relação aos sintomas acabam se igualando no grupos graças em grande parte ao grande 'cross-over' que se tem entre as estratégias, ou seja, ao passar dos anos, muitos do 'braço TMO' acabam sendo submetidos a revascularização por piora de sintomas.
6) A adesão medicamentosa pode ser difícil e muitos pacientes irão optar por se submeter a uma revasculatização com objetivo de alívio de sintomas mais rápido e  reduzir o número de medicações com objetivo apenas de alívio sintomático. Portanto, leve em consideração a opinião do doente. 
7) Realizar a RV não significa abandonar o TMO, mas sim facilitar a adesão medicamentosa do doente através da diminuição de algumas medicações. Além disso, para alguns, ser submetido a um procedimento médico pode servir como um 'divisor de águas' que irá contribuir, também, para um reforço nas mudanças de estilo de vida a serem tomadas.

FAVORECE O TRATAMENTO MEDICAMENTOSO OTIMIZADO INICIAL

1) O TMO faz parte do tratamento de TODO o paciente com doença coronária crônica, independente de ser ou não feita a revascularização, pois as medicações/mudanças no estilo de vida são redutores de mortalidade e infarto. Temos de entender que a revascularização é uma opção a mais para o tratamento anginoso em casos refratários, mas não a substitui. Portanto, mesmo quem é submetido uma ICP ou RVM, deve manter seu tratamento clínico.
2) Os estudos mais recentes, já a luz do tratamento atual envolvendo AAS, estatinas, iECA/BRA e beta-bloqueadores, falham em conseguir mostrar link claro entre o tratamento invasivo e uma redução em desfechos 'fortes', ou seja, morte e IAM.
3) A ICP, método de revascularização mais frequente, falha em conseguir mostrar benefício em relação a aumentar sobrevida nos trabalhos feitos no contexto de doença coronariana estável.
4) Novas modalidades de tratamento, como dupla anti-agregação em um contexto mais tardio após síndrome coronarianas agudas e novas drogas, como os inibidores de PCSK 9 ( um novo hipolipemiantes) vem surgindo e vem a somar esforços na diminuição de morte e IAM.
5) O benefício em relação a qualidade de vida em pacientes submetidos a revascularização parece limitado, sobretudo em relação a ICP quando comparada a RVM. As análises dos estudos são prejudicadas pelo fato de os grupos não serem 'cegos' e outros fatores confundidores estarem presentes. Por exemplo, o paciente que tende a diminuir a intensidade dos sintomas pelo simples fato de ter sido submetido a um 'tratamento mais moderno' ao invés de ter ficado tomando 'só remédio'. 
6) Um 'trial' medicamentoso antes de se pensar em revascularização não põem o doente em risco de consequências graves e pode, muitas vezes, já ser responsável por alívio dos sintomas e melhora de qualidade de vida sem a necessidade de procedimento adicional ( lembrando que tanto a ICP quanto a RVM tem risco inerentes para o doente, inclusive de morte ou sequela grave!).
7) Indicar de rotina revascularização tem um impacto financeiro maior para paciente e para sociedade. Portanto, leve em conta o meio onde você prática a medicina (UBS, Hospital Secundário, Centro de Cardiologia,etc), os recursos que estão disponíveis e a condição sócio-econômica do doente. 
8) A preferência do doente pode ser primeiro a de se fazer um teste com medicação! 

#PS: Sugerimos fortemente a leitura de um texto publicado no Arquivos de Cardiologia em 2014, de autoria do Prof Luís Cláudio Correia, que aborda de maneira brilhante sobre o tema em evidência e também nos faz refletir. O título é: Revascularização Miocárdica Guiada por Isquemia: o Reflexo Oculoisquêmico.

Leitura Sugerida:

Stone et al. Medical Therapy With Versus Without Revascularization in Stable Patients With Moderate and Severe Ischemia The Case for Community Equipoise. STATE-OF-THE-ART REVIEW. Nov/2015. Online first. Disponível aqui

Correia, LCL e cols. Ponto de vista: Revascularização Miocárdica Guiada por Isquemia: o Reflexo Oculoisquêmico. Arq Bras Cardiol. 2014; 102(4):e40-e43. Disponível aqui

terça-feira, 24 de novembro de 2015

Desafio do ECG 10 - qual diagnóstico eletrocardiográfico ?



Fonte: arquivo pessoal do autor
* Os comentários serão publicados na semana seguinte seguidos do novo desafio.

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Desafio de ECG - Caso 9 - Comentário - Veja o ECG clicando aqui

Trombólise em paciente de 19 anos deve sempre APITAR como um alarme na sua mente. Foi esse alarme que apitou quando, em um plantão, recebemos o pedido de transferência de um paciente sexo masculino que havia sido submetido a trombólise com alteplase por um quadro de IAM com supradesnivelamento do segmento ST.

Paciente admitido na sala de emergência, sem queixas, 12h após trombólise. O ECG que havia embasado a situação era esse que apresentamos no Desafio 9.

Nem tudo que supra é 'SUPRA'!

A história era de dor torácica ventilatório dependente há cerca de 4 dias. Pela persistência do quadro, havia procurado um PS próximo de casa. Não havia nenhum alteração digna de nota no exame físico.

Ao ECG:

Taquicardia sinusal do QRS estreito, ritmo regular.

Quando vamos ver o segmento ST, observamos supradesnivelamento do mesmo em praticamente toda as derivações, a exceção de aVR e V1. aVR inclusive encontra-se com supra do segmento PR e infra do ST.

Esses achados do ECG + histórica clínica do doente + epidemiologia fazem o diagnóstico clássico de pericardite aguda, um dos vários diagnósticos diferenciais do supradesnivelamento do ST.

Pode-se dividir os achados da pericardite aguda em 4 fases temporais:

Fase 1: supradesnivelamento difuso do ST com ondas T concordantes. Infra do ST em aVR ou em V1. Depressão do PR. Baixa voltagem.

Fase 2: normalização do ST e do PR. Achatamento da onda T.

Fase 3: onda T invertida

Fase 4: resolução gradual da inversão da onda T

Leitura sugerida:
Electrocardiographic Manifestations and Differential Diagnosis of Acute Pericarditis.Am Fam Physician 1998
Disponível aqui




quinta-feira, 19 de novembro de 2015

Imagens em Cardiologia - Maneira correta de se retirar o introdutor de artéria femural

MANEIRA CORRETA

Fonte: arquivo pessoal do autor
Observe na primeira foto a maneira correta de retirada do introdutor ( veja mais detalhes aqui ). Note que o orifício de retirada fica visível ( observe o O na foto) e a compressão é feita acima desse ponto. Não se deve colocar gaze no orifício, pois assim, poderemos perder a noção de a compressão está efetiva do vaso (observe abaixo a maneira incorreta do procedimento) e só 'descobririamos' a inefetividade da compressão quando a gaze começasse a ficar embedida de sangue.

O A representa a topografia arterial - acima da região inguinal fica a ilíace externa e, abaixo, femural comum, por isso a importância de uma boa palpação de pulso antes de realizar o procedimento.

Lembrando que a técnica se aplica a retirada de qualquer dispositivo médico em topografia de art femural, seja introdutor para cateterismo ou cateter para medição de pressão arterial invasiva, por exemplo.

Se é para comprimir 15/20 min, que sejam só 20 min. A técnica correta evita danos ao paciente e prolongamentos desnecessários!

                MANEIRA INCORRETA


Fonte: arquivo pessoal do autor

quarta-feira, 18 de novembro de 2015

Doutor, não sinto pulso carotídeo ? O que fazer ?

Aproveitando a abordagem do nosso último post sobre pulso femoral na parada, discutiremos um artigo inusitado e com uma visão "fora da caixa" sobre a parada cardiorrespiratória. 

Os guidelines da AHA ( American Heart Association) recomendam ao profissional capacitado para suporte avançado de vida checar o pulso central entre 5-10 segundos para decidir iniciar reanimação cardipulmonar  em indivíduos que não respondem a estimulação física/verbal e não tem pulso. No entanto, a habilidade de checar o pulso carotídeo por profissionais de saúde foi avaliada apenas em alguns estudos pequenos antes da recomendação da diretriz. Pensando nisso, pesquisadores da Alemanha projetaram um estudo com o intuito de avaliar a capacidade dos profissionais de reconhecer um paciente sem pulso carotídeo, bem como o intervalo de tempo necessário para tal. 

O desenho do estudo é bem interessante: 16 pacientes submetidos a cirurgia de revascularização miocárdica com uso de circulação extracorporéa  (CEC) eram avaliados por profissionais de diferentes categorias ( Estudantes em treinamento, Técnicos de emergência em treinamento, Paramédicos em treinamento e Paramédicos 'seniors') e deveriam reportar ao examinador a presença ou não do pulso carotídeo. Os profissionais eram cegados para o status circulatório do paciente e toda monitorização do paciente estava fora do campo de visão do participante. 

Pontos essenciais:

1) Durante a CEC o paciente não apresenta pulso carotídeo pela fato do fluxo sanguíneo ser contínuo. 2) Durante circulação espontânea o pulso deveria ser palpável ( Com pressão arterial invasiva indicando PAS>80mmHg em todos os momentos do teste)

Os resultados do estudo são surpreendentes: a média para decisão dos participantes entre foi de 24 segundos!

É interessante observar que apenas 15% do participantes conseguiu identificar corretamente a presença ou não do pulso nos 10 segundos recomendados atualmente pela AHA (veja a figura 3).



Percentual de distribuição das respostas de acordo com presença ou não de pulso e a resposta dos participantes. 

Coluna 1: paciente com pulso e detecção de pulso pelo participante ~80% de acerto. 
Coluna 2: paciente sem pulso e detecção de pulso pelo particitante ~ 5%. 
Coluna 3:  paciente sem pulso e sem detecção de pulso pelo participante ~ 53%. 
Coluna 4: paciente com pulso e ausência da detecção de pulso pelo participante: ~ 65%,

Figura 2: Acurácia diagnóstica de ausência de pulso central de acordo com qualificação do profissional ( EMT 1 --> PM2). Note que com o aumento da capacitação a sensibilidade chega a a 100% ( isto é todos os pacientes sem pulso eram diagnosticos corretamente), mas note como a especificidade é baixa ( isto é: muitos pacientes com pulso eram diagnosticados como em PCR). Acurácia em todos os participantes foi de 65% ( sem o limite de tempo de 10 segundos - o tempo médio de resposta para esta acurácia foi de 24 segundos)

Figura 3: retardo em fazer o diagnóstico do pulso de acordo com o presença ou não ou de pulso dos pacientes. Seguindo o corte da AHA de 10 segundos para detecção ou não do pulso central, a grande maioria dos participantes tem um retardo em realizar o diagnóstico sobre o pulso, principalmente naqueles pacientes sem pulso ( losango branco)
Com base neste estudo e em outros estudos semelhantes, em 2010 a AHA retirou a necessidade de checar o pulso para indivíduos leigos / apenas treinados em BLS ( fonte ACLS uptade 2015):


No entanto, ainda permanece a recomendação para profissionais de saúde ( fonte ACLS uptade 2015)


Qual a relevância deste estudo?

1) É muito mais difícil tomar uma decisão sobre a presença ou não de pulso em pacientes sem pulso do que naqueles com pulso.

2) O tempo de 10 segundos parece ser INEFICIENTE para a tomada de decisão

3) O indíce de erro em uma situação de vida real é excessivamente alto mesmo para profissionais treinados para situações de emergência ( Paramédicos com experiência > 2 anos) 


Obviamente que após este estudo - e outros similares - uma série de estudos foram realizados na tentativa de validar o uso do USG doppler para checar o pulso central em situações de PCR. Sem, no entanto, provar benefício do uso do USG doppler para pacientes em PCR. Na última atualização do ACLS publicada neste ano foi feita a seguinte referência ao uso do USG  durante PCR: pode ser usado desde que não atrapalhe a PCR 'convencional" ( recomendação também validada para pesquisa de sinais de TEP, pneumotórax, hipovolemia, tamponamento pericárdico durante a parada  através do USG)



Até que se mudem as diretrizes a recomendação é: se o profissional de saúde não detectar um pulso em 10 segundos deve-se iniciar a reanimação imediatamente, considerando-se principalmente o fato de que as compressões torácicas são uma intervenção relativamente benigna (frente ao risco de não se reanimar um paciente em PCR)

Aguardaremos novidades no uso do USG para checagem do pulso na parada!


Leitura sugerida: 





domingo, 15 de novembro de 2015

10 mandamentos dos testes não-invasivos na doença coronariana estável!

Fonte: 'Os dez mandamentos', 1956. Direção: Cecil DeMille, ator John Charles Carter

Decidir a respeito de solicitação/interpretação de exames de imagens não-invasivos no contexto da doença coronaria estável não é tão simples quanto muitos podem pensar. As várias modalidades disponíveis em cada serviço e as múltiplas variáveis fornecidas por esses métodos devem ser conhecidas do cardiologista para que a melhor conduta para cada paciente seja tomada. Aqui vão 10 pontos que consideramos fundamentais e que merecem reflexão!

OS DEZ MANDAMENTOS  DOS EXAMES NÃO-INVASIVOS

1 - Sempre analisarei o ECG de base do doente antes de pensar em pedir ergométrico, uma vez que alterações de ECG como presença de bloqueios de ramo, arritmias e hipertrofia ventricular podem tornar difícil a interpretação deste exame. Além disso, julgarei sobre sua capacidade para exercício ( doença pulmonar associada ou presença de problemas neurológicos/ortopédicos) e função renal no sentido de decidir sobre outras modalidades de exame factíveis para o doente.

2- Sempre que possível irei OPTAR pelo uso de STRESS FÍSICO em detrimento do uso de fármacos, por simular melhor a fisiologia do doente.

3- Jamais esquecerei que os exames não-invasivos podem ser feitos em 3 contextos: para diagnóstico, prognóstico e avaliação de terapia medicamentosa. Por isso, ao me deparar como resultado do exame tentarei recordar em que cenário o mesmo foi pedido.

4 - Sempre irei calcular a probabilidade pré-teste para definir qual tipo de exame irei pedir em meu paciente. Lembrando que entre 15-50% a angiotomografia de coronárias é boa, entre 15-65% podemos também usar Teste Ergométrico e entre 15-85, mas sobretudo entre 65-85% irei optar por exames de imagem funcionais - Ecocardiografia de Stress e Cintilografia de Perfusão Miocárdica.

5 - Quando estiver pedindo teste para avaliação diagnóstica de isquemia, lembrarei de suspender os beta-bloqueadores 48-72 antes do exame e os bloqueadores de canal de cálcio e nitrato no dia do mesmo.

6 - Prometo que, ao analisar o laudo de um exame, NÃO irei apenas ler o laudo, mas sim buscar as variáveis que possam me indicar prognóstico em relação a doença coronariana! 

7 - Prometo que não irei ficar pedindo provas de isquemia anuais em pacientes que não tiverem tido eventos ou mudança de classe funcional.

8 - Salvo melhor juízo, NÃO PEDIREI EXAMES para pacientes sem sintomas sugestivos de angina par fins de 'rastreamento' de doença coronariana!

9 - Sempre terei em mente que a fração de ejeção baixa, desde que não relacionada a outra causa que não a isquêmica, mesmo em repouso, será sempre um critério de pior prognóstico.

10 - Por fim, prometo que sempre avaliarei o paciente como um todo ( sintomas, idade, co-morbidades,  preferências, medos, etc) e não o resultado isolado do teste para definir a melhor conduta terapêutica.



sexta-feira, 13 de novembro de 2015

Infarto no paciente jovem - quais as peculiaridades ?

A doença aterosclerótica coronariana ( DAC ) é uma doença que tende a manifestar-se em pessoas mais velhas. A definição de infarto agudo do miocárdio (IAM) em pessoas jovens ocorre quando este evento situa-se em uma população abaixo dos 40-45 anos.

A prevalência de doença coronariana nessa população é difícil de ser estimada, haja vista a grande casuísta que é assintomática.

Em estudos populacionais, observa-se uma taxa cerca de 5-10 x maior da incidência de IAM em pessoas com mais de 45 anos em comparação aos de menor idade.

A presença de história familiar de doença coronariana, tabagismo, alterações de colesterol, intolerância a glicose, obesidade e uso de cocaína são mais frequentes nessa população. Essa maior intensidade de fatores de risco (FR) pode ser responsável pela  'perda do efeito protetor relacionado a idade' e estar diretamente relacionada ao aumento de IAM nessa população esperado nos próximos anos, uma vez que há cada um aumento gradual de jovens com essas condições predisponentes.

O fato, contudo, é que os jovens também infartam e temos de estar atentos para isso. Muitas vezes um tempo de atendimento precioso é perdido nessa população por ficarmos 'desconfiados demais' se estamos, ou não, lidando com uma Síndrome Coronariana Aguda (SCA).

Devemos agir com rapidez pois, quando bem manejado, o prognóstico em jovens acaba sendo melhor que na população idosa e isso tende a minimizar o impacto financeiro a sociedade, além de grande repercussão psicológica no indivíduo afetado. 

Podemos dividir em a abordagem baseado em 4 cenários:

1) Doença coronariana aterosclerótica

A doença ateromatosa começa ainda na infância e está ligada a fatores convencionais de risco coronariano, sobretudo o uso de cigarro, que é o fator modificável mais frequente.
Anormalidades lipídicas, especialmente hipertrigliceridemia e HDL baixo, associados a intolerância a glicose tem uma prevalência alta nesses indivíduos.

Outros fatores de risco, com a questão do stress e raiva, bem como o papel da hiperhomocisteinemia parecem desempenhar um papel importante.

2) Doença coronariana não-aterosclerótica

A presença de anomalias congênitas podem estar presentes e diretamente relacionadas ao infarto do doente. Muitas vezes, só será descoberta através de uma dificuldade de se realizar o localizar o óstio da coronária.

Também pode ocorrer as chamadas pontes miocárdicas, onde ocorre um trajeto intramiocárdico dos vasos coronarianos, que não é habitual. Assim, durante a sístole, a compressão muscular pode gerar colabamento da luz coronariana e, consequentemente, isquemia.

Dissecção espontânea coronária, sobretudo em mulheres e na descendente anterior, também pode causar IAM. Chama a atenção as mulheres em período periparto. 

Outras causas menos usuais: embolia séptica de vegetação em valva aórtica com endocardite, embolia paradoxal através de forame oval patente e a presença de aneurismas coronarianos congênitos ou adquiridos.

3) Estados de hipercoagulabilidade

Ganha destaque a Síndrome de Anticorpo Antifosfolipide ( SAAF) - também conhecida por Síndrome de Hughes - que está associado a embolia arterial e venosa, podendo ser primária ou associada a doenças reumatológicas, sobretudo o Lupus Eritematoso Sistêmico ( LES)

Mutação do fator V de leiden e deficiência de proteína C e S são outras potenciais causas.

Pacientes portadores de Síndrome Nefrótica também estão em estado de maior coagulação, sobretudo pelo déficit da antitrombina III, que passa a ser importante quando temos albumina menor que 2,0 mg/dl.

Por fim, lembrar do uso de anticoncepcionais orais, sobretudo em mulheres jovens que tenham outros fatores de risco, como obesidade e tabagismo.

4) Secundário a substâncias de abuso

 Uso de drogas recreacionais, mais comumente a cocaína, é responsável por até 50% de quadros de dor torácica não traumática em algumas emergências. Lembre-se que os efeitos da cocaína podem ser tão longos quanto próximo de 80 horas após uso e não apenas quando 'acabou de usar'. Além disso, muitos pacientes usuário da droga também são fumantes. O mecanismo causador da isquemia é múltiplo: hipercoagulabilidade, vasoespasmo e aumento de tônus simpático. Além de infarto, podemos ter quadros de arritmias ventriculares e endocardite, quando o uso via endovenosa, que não é tão prevalente em nosso País.

* Há autores que optam por uma divisão de causas baseado em achados de coronariografia normal x anormal. Por consideramos que o conceito de 'normalidade' angiográfica pode ser relativo e considerando que uma parcela não desprezível de pacientes jovens com SCA acaba, por diversos motivos, não sendo submetido a angiografia optamos por não utilizarmos essa abordagem.

APRESENTAÇÃO

A grande maioria desses paciente tem o IAM como primeira manifestação isquêmica. É incomum a apresentação na forma de angina em crescendo ou mesmo história prévia de Angina Estável.

Podem apresentar sudorese, midríase, algum grau de ansiedade, maior tendência a hipertensão, sobretudo quando fizeram uso de drogas.

Procure estigmas de dislipidemia, sobretudo quadros familiares. Presença de xantomas, xantelasmas, espessamento de calcâneo, halo corneano 

MANEJO

Os cuidados em relação a esses pacientes seguem as mesmas rotinas das principais diretrizes nacionais e internacionais sobre o assunto. Selecionamos abaixo alguns pontos peculiares:

- Realize ECG seriado. Muitas vezes não há elevação do ST inicial e, em outras, a permanência do supra do ST é transitória secundária a fenômeno de vasoespasmo
- Tenha sempre em mente outros diagnósticos diferenciais para dor torácica do doente: TEP, pericardite, miopericardite, dissecção de aorta
- Evite uso de betabloqueadores em pacientes com história do uso de cocaína, haja vista que pode-se ter uma piora do vasoespasmo. Isso ocorre pela a suspensão do estimulo beta adrenérgico deixando com que a resposta alfa-adrenérgiga - que é vasoconstrictora - predomine. Uso de benzodizeapinicos nesse situação é preferencial e não há dose definida. Aplica-se e vai vendo a resposta do paciente.
- No caso de supra do ST, avalie se o uso de nitratos não reverte a anormalidade. Do contrário, proceda a trombólise química ou coronariografia a depender do que é disponível sem seu serviço. Nessa situação, em particular, recomenda-se que a coronariografia seja a primeira opção, pelo fato de haverem outros mecanismos que não a aterosclerose como possíveis implicados nesse evento em que o uso do trombolítico poderia ser ineficaz. Contudo, na falta de laboratório de hemodinâmica, deve-se trombolisar o doente sem hesitar!
- Suspenda a anticoncepção oral e mude, preferencialmente, por métodos não hormonais.
- O papel do anticoagulante no manejo crônico desses doentes pode ter papel fundamental, haja vista o risco de a SCA ter sido desencadeada resultando de alguma trombofilia. Em geral, após 2-3 meses do evento, costumamos realizar alguns exames para rastreio dessas doenças:

- Anticoagulante Lúpico
- Anticardiolipina IgM e IgG
- Anti-B2 Glicoproteina 1
- Homocisteina
- Mutação do Fator V de leiden
- Proteína C e S
- Protrombina mutante

Leitura sugerida:

Egred, Viswanathan, Davis .Myocardial infarction in young adults. Review. Postgrad Med J 2005;81:741–745. doi: 10.1136/pgmj.2004.027532. Disponível aqui

Osula, Bell, Hornung. Acute myocardial infarction in young adults: causes and management. Postgrad Med J 2002;78:27–30. Disponível aqui

segunda-feira, 9 de novembro de 2015

Desafio de ECG 9 - Qual diagnóstico eletrocardiográfico ?



Jovem do sexo masculino com 19 anos. Encaminhado de outro serviço após ser 'trombolisado com Alteplase',  referia dor torácica não anginosa há 5 dias.

Tudo que supra é IAM ? Qual diagnóstico eletrocardiográfico ?

*As respostas do casos virão sempre na semana seguinte acompanhados de novo desafio.

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Desafio de ECG - Caso 8 - Comentário - Veja o ECG clicando aqui

Taquicardia Ventricular Fascicular ou TV 'verapamil-sensível'.

O padrão eletrocardiográfico de TV é feito baseado no Algortimo de Brugada ou mesmo no Escore de Santos, disponível aqui .

O paciente em questão apresentou a crise após suspender, sem orientação médica, o Verapamil.

Veja que, além do QRS alargado, apresenta-se um padrão de BRD ( V1 positivo - apesar de ser R puro) + Bloqueio Divisional Antero-Superior (BDAS), que torna muito provável que trate-se de uma TV Fascicular de origem no fascículo póstero-inferior do ramo esquerdo, que é o local mais comum de origem dessa arritmia. Sendo assim, muitas vezes, o QRS não é tão largo, uma vez que, apesar da origem ser ventricular, o estímulo se propaga utilizando como fonte o tecido especializado de condução. Isso é importante pois pode haver certa confusão no diagnóstico diferencial em relação a Taquicardias de origem supra-ventricular.

Essa arritmia classicamente é responde muito bem ao Verapamil endovenoso.

O ECG é sugestivo, mas o diagnóstico é definitivo é feito através de Estudo Eletrofisiológico (EEF).

Em geral, é uma arritmia do paciente do sexo masculino, jovens - 15 a 40 anos - e que não possuem cardiopatia estrutural associada. As crises podem apresentar-se de maneira paroxística - mais comum - ou incessante ( quando persistentes e de difícil tratamento, podendo desenvolver taquicardiomiopatia).

Não está associada a morte súbita.

Leitura sugerida:

Taquicardia Ventricular Fascicular. Experiência com Ablação por Radiofrequência. Magalhães, Sônia et al Rev Port Cardiol 2006; 25:485-97. Disponível aqui

Taquicardia Ventricular Fascicular Idiopática. Características Clínicas, Eletrocardiográficas, Eletrofisiológicas e Opções Terapêuticas. José Carlos Moura Jorge. Tese de Mestrado. Disponível aqui

Caso Clínico – Palpitação em paciente jovem sem cardiopatia estrutrual. Luiz Eduardo Camanho. Disponível aqui


sábado, 7 de novembro de 2015

Fibrilação atrial no consultório: controle do ritmo ou da frequência cardíaca ?

Fonte: https://pixabay.com/pt/pergunta-por-que-marca-problema-892904/
O paciente portador de fibrilação atrial tem várias peculiaridades em relação a seu manejo, sobretudo pelo contexto em que essa arritmia pode se manifestar. Uma das decisões clínicas em que se tem maior importância é a respeito do tipo de abordagem em relação ao ritmo do paciente.

Afinal, em que paciente eu irei optar apenas pelo controle da frequência cardíaca e em qual qual irei tentar o controle de ritmo, seja por cardioversão (CV) ou através de ablação por radiofrequência ?

Alguns pontos tem de ficar claros antes de tomar essa decisão:

1) Ambas estratégias podem falhar ao longo do tempo e, eventualmente, a estratégia para o mesmo paciente pode mudar a depender da condição clínica da pessoa. Por exemplo, paciente em controle de FA que passa a ter muitos sintomas de palpitação, recorrentes e trazendo muito incômodo no seu dia-a-dia podem ser submetidos a tentativa de controle de ritmo para se tentar melhora qualidade de vida.

2) Não se deve escolher controle de 'ritmo' pensando em se 'livrar o paciente da necessidade da anticoagulação'. A indicação da anticoagulação é feita pela CHA2-DS2-VASc e indepente se a estratégia é pelo controle do ritmo ou da frequência. Dados do estudo AFFIRM foram bastante claros ao se mostrar o risco de AVCi em pacientes que estavam em 'manutenção de ritmo' e não estavam usando anticoagulantes.

3) O paciente que está em controle de 'ritmo' também deve ter vigilância para se manter frequência cardíaca adequada.

4) A maioria dos estudos feitos até então não mostraram superioridade do controle de ritmo em relação ao controle de frequência cardíaca, a despeito do conceito inicial de que a 'manutenção do ritmo seria mais fisiológica'.

O último guideline da AHA - 2014, deixa um pouco a desejar sobre qual orientação o leitor deve seguir a respeito dessa decisão, haja vista que simplesmente não há um tópico do estilo 'Controle de FC x ritmo na FA: quando escolher'. Isso ocorre justamente pelo fato de que as estratégias em grande parte são equivalentes e a subjetividade da relação médico-paciente e a individualização de cada caso é que irá comandar essa decisão.

Além disso, apesar de parecer mais fisiológico manter o doente em ritmo sinusal, sabe-se que muitos pacientes a despeito de estarem no braço do 'controle de ritmo', apresentam muitos momentos de FA que não são documentados, além de terem de ser submetidos a um controle mais rigoroso em relação ao uso de fármacos antiarrítmicos, que pode impactar em sua qualidade de vida.

O primeiro passo é revisar as definições de FA para que possamos definir bem que tipo de paciente estamos abordando. 

Nesse post estamos falando de pacientes com FA persistente e persistente de longo prazo atendidos em um cenário ambulatorial. Recomendações para FA paroxística e FA aguda sintomática no PS serão abordadas em outros posts.

- FA paroxística: FA que termina espontaneamente ou com intervenção em até 7 dias. Pode haver recorrência de FA com frequência variável
- FA persistente: FA que se mantém por mais de 7 dias - 12 meses
- FA persistente de longo prazo: FA que se mantém por mais de 12 meses
- FA permanente: quando o paciente + médico optaram por manter apenas o controle de FC. Veja que essa definição não depende do tempo. Posso ter uma FA descoberta há 15 dias e que já se tomou a decisão conjunta de se fazer apenas controle do frequência.

O controle de ritmo pode ser através de: cardioversão elétrica, química, ablação por radiofrequência percutânea ou durante procedimentos cirúrgicos.

O controle de frequência utiliza-se de fármacos que lentificam a condução AV, notadamento beta-bloqueadores, bloqueadores de canal de cálcio não-diidropiridínicos, digital e, eventualmente, a amiodarona.

Os estudos que compararam controle de FC x ritmo utilizaram como desfecho taxas de morte e de eventos tromboembólicos e, de maneira geral, mostraram que as duas opções foram semelhantes em relação a esse desfecho.

Sendo assim, ponderamos algumas situações que irão pesar mais para controle de ritmo e outras em que se favorecerá o controle de FC, mas apenas a individualização é que poderá determinar em qual das estratégias o doente se encaixa.

FAVORECE O CONTROLE DE RITMO

- Pacientes com disfunção ventricular que permanecem sintomáticos e estejam em vigência de FA
O pensamento é de que nesses pacientes o retorno do batimento atrial efetivo seria muito importante para melhora hemodinâmica do doente e manejo da sua IC
- Pacientes que, a despeito de não terem disfunção ventricular, possuem muitos sintomas decorrentes da FA, sobretudo palpitações e que considerem que isso os está atrapalhando em seu dia-a-dia.
- Pacientes mais jovens ( < 65 anos) e sintomáticos
- Pacientes em primeiro episódio de FA
- Pacientes em que o átrio é pequeno ( < 45 - 50 mm)
- Pacientes em que, apesar de terem sua FC controlada com fármacos, mantém-se ainda sintomáticos: palpitações, dispnéia, pré-síncope, angina, etc. Nesses casos uma tentativa de se tentar controle de ritmo seria uma opção
- Pacientes onde se tentou a estratégia de controle de FC, mas não obtiveram sucesso, a despeito do uso de mais de um fármaco. Sobretudo naquelas em que se tem a suspeita de cardiomiopatia secundária a taquicardia.
- Pacientes com < 1 ano de FA. Sabe-se que o sucesso na manutenção do ritmo é maior quanto menor o tempo do doente com a arritmia.
- Opção do paciente

FAVORECE O CONTROLE DE FREQUÊNCIA

-  Pacientes oligo-assintomáticos.
- Pacientes com átrios grandes (> 50 mm), onde o remodelamento cardíaco nessa região e a área fibrótica irão tornar muito difícil que se consiga manutenção de ritmo em médio/longo prazo.
- HAS crônicos sem controle adequado.
- Naqueles em que já se foi tentado controle de ritmo e se houve falha.
- FA persistentes de longo prazo.
- Pacientes mais velhos ( > 80 a) geralmente tem quadros de FA há muito tempo ( > 1 ano) e são mais susceptíveis a efeitos coletareis dos fármacos antiarrítmicos.
- Opção do pacientes.

MENSAGEM FINAL:

- A indicação de anticoagulação independe da estrátegia em relação ao ritmo. Portanto, não deve ser levada em consideração na opção entre controle de ritmo x FC.

- NÃO HÁ MATEMÁTICA CLARA! Nesse quesito, a MEDICINA É ARTE e a INDIVIDUALIZAÇÃO do paciente é fundamental.

- Muitas vezes a melhor estratégia para o doente só será conhecido após tentativa e erro.

- Um protótipo de paciente para controle de ritmo seria aquele < 65 anos, com FA há menos de 1 ano, sem hipertensão e com átrio < 50 mm

- Aquele senhor de 78 anos, com poucos sintomas, com seu átrio de 49 mm e com FA sabida há 2 anos seria melhor candidato a controle de frequência cardíaca.

Leitura sugerida:

Kumar, K e cols. Rhythm control versus rate control in atrial fibrillation. Acessado em out/2015 em uptodate.com/online

Waldo, AL. Rate Control versus Rhythm Control in Atrial Fibrillation: Lessons Learned from Clinical Trials of Atrial Fibrillation. Progress in Cardiovascular Diseases, 2015-09-01, Volume 58, Issue 2, Pages 168-176.

2014 AHA/ACC/HRS Guideline for the Management of Patients With Atrial Fibrillation A Report of the American College of Cardiology/American Heart Association Task Force on Practice Guidelines and the Heart Rhythm Society Developed in Collaboration With the Society of Thoracic Surgeons Disponível aqui

quinta-feira, 5 de novembro de 2015

SPRINT trial: mudança de paradigmas?

 O controle pressórico adequado é fundamental para diminuir a incidência de doenças cardiovasculares (DCV). Contudo, ainda é fonte de alguma controvérsia o valor pressórico que deve ser tomado como 'ideal a ser alcançado'.

 Segundo recomendações do VIII JOINT Americano, publicado no final de 2013, níveis tensionais abaixo de  140 x 90 mmHg são satisfatórios na maior parte da população, e em  subgrupo de pacientes, como os idosos, podemos ser mais liberais com metas pressóricas < 150 x 90 mmHg. Essas recomendações podem ser conferidas aqui.


 Essas recomendações são seguidas por boa parte dos médicos que lidam com pacientes hipertensos, mas ainda há grupos que defendam que um controle mais agressivo teria beneficio para alguns pacientes. 

 Sendo assim, para alguns pesquisadores, ainda fica a dúvida se um controle mais 'rígido' de valores pressóricos não conseguiria diminuir a mortalidade desses pacientes.

 Para responder essa questão, o National Institutes of Health (NIH) dos Estados Unidos encomendou um estudo, o SPRINT TRIAL, em que comparou o controle pressórico mais intensivo versus o controle habitual. 

 O estudo ainda não foi publicado em sua íntegra, no entanto, o NIH fez uma apresentação preliminar de dados do estudo após o término prematuro do mesmo devido o desfecho de benefício ter sido atingido. 

 Então, vamos aos dados preliminares.

 Desenho
Pacientes foram randomizados para o controle pressórico intensivo (PA sistólica < 120 mmHg) ou controle pressórico habitual (PAS < 140 mmHg).

·  Número total de participantes: 9,361
·  Duração do seguimento: 5 anos

Critérios de inclusão:

·  Idade  ≥ 50 anos
·  Hipertensão com PA sistólica  ≥ 130 mmHg

Pelo menos um fator de risco para doença cardíaca:

·   Presença clínica ou subclínica de doença cardiovascular, menos AVC
· Doença renal crônica, definida como a função glomerular estimada (eGFR) 
    20-59 ml/min/1.73 m2
·  Escore de risco de  Framingham  ≥ 15%
·  Idade  >75 anos

Critério de exclusão:

· A indicação por algum anti-hipertensivo  e o paciente não está tomando e não foi documentado que a paciente  era intolerante a esta classe de droga.
·  Hipertensão secundária conhecida
·  PAS< 110 mmHg após 1 minuto em pé
·  Proteinúria
·  Circunferência do braço muito curta ou grossa para permitir acurada medida da PA com os aparelhos avaliados.
·  Diabetes mellitus
·  História de AVC
·  Doença renal policística
·  Glomerulonefrite tratada ou com indicação de ser tratada com imunossupressor
·  TFG <20 ml/min/1.73 m2 ou estágio final de doença renal
·  Evento Cardiovascular ou hospitalização por angina instável nos últimos 3 meses.
·  Insuficiência cardíaca sintomática nos últimos 6 meses ou FE< 35%
·  Condição médica que limite a sobrevida por menos que 3 anos ou doença maligna que não o Câncer de pele nos últimos 2 anos
·  Algum órgão trasplantado

PRINCIPAIS ACHADOS

 O desfecho primário composto por infarto agudo do miocárdio, síndrome coronariana aguda, AVC, Insuficiência Cardíaca Congestiva ou morte cardiovascular, foi significativamente menor, aproximadamente 33%, no braço do grupo com  controle intensivo da PA comparado com o manejo de rotina. A mortalidade foi reduzida em aproximadamente 25%. O trial foi terminado assim que a evidência de beneficio foi atingida. O texto final está sendo aguardado.

COMENTÁRIO

 Podemos observar que nesse estudo pacientes idosos (>75 anos), pacientes com alto risco cardiovascular estimado e pacientes já com lesão de órgão alvo, como doença renal crônica em estado não terminal, foram inclusos dando a entender que nesse grupo de pacientes  o controle rigoroso é melhor. Vale lembrar que pacientes com diabetes e AVC prévio não foram incluídos no estudo e, assim, não podemos extrapolar tal meta para esses pacientes.

 Será que podemos ter uma  mudança de paradigma no controle da hipertensão arterial sistêmica? Vamos primeiro aguardar  a publicação oficial do estudo para podermos fazer uma analise crítica   sobre os resultados encontrados. Sabemos que de um lado da balança há uma industria farmacêutica sedenta por vender remédios e com possível atuação midiática a respeito dos resultados desse trial, que ainda são preliminares. Por hora preferimos ficar com as recomendações atuais vigentes, enquanto aguardamos o resultado final do estudo.


Leitura sugerida:

Press Release: National Institutes of Health. Landmark NIH study shows intensive blood pressure management may save lives. September 11, 2015.

Study Design: Ambrosius WT, Sink KM, Foy CG, et al., on behalf of the SPRINT Study Research Group. The design and rationale of a multicenter clinical trial comparing two strategies for control of systolic blood pressure: the Systolic Blood Pressure Intervention Trial (SPRINT). Clin Trials 2014;11:532-46.